Fomos convidados pelo Festival do Rio para assistir a segunda sessão de “Emilia Pérez”, 1 dia após a première do Festival para convidados e imprensa, que o escolheu como obra para a gala de abertura.
Passamos algum tempo pensando em como começar uma resenha sobre o filme mais aclamado criticamente da carreira da nossa artista favorita. E – honestamente – não vai ser fácil.
Não vai ser fácil porque o filme não é um filme simples. “Emilia Pérez” é um filme musical de comédia e drama dirigido por Jacques Audiard, que vai muito além destes 2 gêneros.
A história gira em torno de um temido chefão do tráfico mexicano, Manita del Montes (Karla Sofia Gascón), que, ao longo de sua vida no crime, decide mudar completamente seu destino. Buscando um novo começo, ele foge da lei ao decidir passar por uma cirurgia de redesignação sexual para reafirmar a mulher que sempre sonhou em ser, Emilia Pérez.
E, para isso, conta com a “ajuda” de uma advogada insatisfeita com sua própria carreira, Rita (Zoe Saldaña), que vê nesta oportunidade apavorante uma chance de enriquecer e não precisar mais trabalhar para seu chefe babaca.
Para atingir seu maior sonho, Manitas precisa forjar sua morte, deixando para trás Jessi (Selena Gomez), sua esposa mais jovem, e seus dois filhos.
O primeiro ato, assim como a maior parte do filme, é conduzido por Zoe Saldaña em uma atuação espetacular. Já nele, somos introduzidos às 3 personagens principais da história, apesar de seu foco ser em como Emilia (ainda Manitas) e Rita começam sua relação profissional, e como a advogada faz de tudo para concluir seu objetivo.
Os números musicais estão mais concentrados neste ato, apesar de serem presentes o filme todo (afinal, é um musical, rs). Temos músicas para a apresentação de Rita, Manitas, e para as mais diversas situações da obra, como um ato musical sobre a redesignação de gênero da forma mais almodovaresca possível, em um ótimo sentido.
Zoe Saldaña e Karla Sofia Gascón dão aulas de atuação. Ambas as atrizes, não só no primeiro ato, como também ao longo de todo o filme, estão atuando em seu ápice artístico. A sensação é de que as duas parecem ter nascido para interpretar seus respectivos papeis, sem exageros.
No segundo ato é onde temos mais aprofundamento no enredo de Jessi. Emilia, após 4 anos de sua cirurgia, contrata Rita novamente para que traga sua esposa e filhos de volta para ela, pois não se sentia completa e feliz sem sua família. Aqui, enredo explora mais os temas de identidade das duas personagens, a redenção de Emilia e a complexa relação familiar que a protagonista tenta reconstruir com sua esposa Jessi.
Em uma das cenas mais cômicas do filme, vemos o reencontro de Jessi com Emilia, que se apresenta como uma prima distante de Manitas. Não iremos comentar mais do que isso, mas tenham em mente que o cinema todo emitiu uma alta risada nesta cena.
Também no segundo ato é onde temos a primeira sequência musical de Selena, “Bienvenida”. E é aqui que quem vos escreve começou a tremer. A canção tem uma energia vibrante e agressiva bem diferente de tudo que já vimos da artista. Além disso, sua entrega emocional, comprometimento e vocais estão no ponto. Sem exageros e sem ausências. Emocionante.
A letra da canção trata sobre o momento que Jessi está vivendo. 4 anos depois da morte de seu marido, ela é obrigada a ir de volta ao México por uma prima distante do próprio para viver com ela, uma mulher até então desconhecida que dedicava a vida a ajudar famílias de desaparecidos por conta dos carteis mexicanos a encontrarem os cadáveres (ou restos mortais) de seus entes queridos.
Também vemos no fim deste ato a performance de “Mi Camino” no karaokê, com a personagem de Edgar Ramirez, Gustavo. Aqui, também podemos ver uma Selena confiante e confortável em sua personagem, inclusive com vocais ao vivo misturados com a música tradicional do musical (gravada).
Já o terceiro ato, o mais eletrizante do filme, é onde temos toda a ação concentrada. É nele que temos as interpretações mais precisas e emocionantes da obra. A sequência que antecede o final do filme é, provavelmente, a mais arrebatadora e desafiadora da carreira de Selena.
Não vamos dar spoilers e nem descrever toda a obra, pois entendemos que a experiência de assistir deve ser única. E, acreditem, vale a pena ir ao cinema sem receber nenhum spoiler. Mas, podemos dizer que o filme se desenrola em diferentes tons – Comédia, Drama, Ação – e cumpre todos com magnificência. O filme faz jus a todo o hype que vem recebendo. E após assistir, conseguimos entender a premiação coletiva de “Melhor Atriz” para o elenco feminino do filme em Cannes. Selena, Karla, Zoe e Adriana são destaques muito positivos em seus papeis.
Consideramos o filme uma mescla de elementos operáticos e visuais extravagantes, com números musicais que dão um tom surreal e criativo à narrativa. Se podemos tecer uma crítica a ele, seria sua duração. Apesar de ser um musical, a história poderia se desenrolar por, pelo menos, mais 30 minutos.
Por fim, ainda que o papel de Selena seja de coadjuvante, nos deixa felicíssimos vê-la participando de filmes tão relevantes e respeitados artisticamente. Sabemos o quanto ela batalhou por isso, e ver que ela está alcançando seus objetivos com maestria e sendo reconhecida por sua maior paixão é muito gratificante.
“Emilia Pérez” chega aos cinemas do Brasil dia 6 de fevereiro, com distribuição da Paris Filmes.
Nota: 5/5.
Autor: Alberto Antony